sábado, 30 de novembro de 2013

"Ela tinha uma lembrança absurda de um dia em que encheu uma folha sulfite com o nome do dito cujo e, no centro, escreveu “e a cada 10 palavras, 9 se transformam em teu nome”... Não parecia assim tão absurdo quando ela tinha 13 anos. Não parecia tão absurdo enquanto entregava aquilo pra ele, com a cara mais patética que conseguiu fazer: uma mistura de sorriso, vergonha e torpor, embora achasse que sabia exatamente o que estava fazendo. Não. Não parecia absurdo. Parecia a coisa mais certa e corajosa a se fazer. Parecia a única maneira de tirar um pouco daquilo da cabeça. Era como se, entregando aquela carta, ela entregasse um pedaço do sentimento, do carinho; uma parcela dos pensamentos, das vontades. E acreditou, com todas as suas forças, que quando ele soubesse sobre o que ela sentia, uma sementinha seria plantada e aquilo ali um dia viraria uma árvore enorme e florida... Vocês já sabem o final da história... É aquele em que nada do que ela pensou deu realmente certo, mas o sofrimento também não foi tanto quanto ela imaginou que seria. Como todos os amores imaginários, passou. Passou e deixou uma sensação infantil e até meio doce." 

"Les Amours Imaginaires" (olha que coisa lindinha, dita assim, em francês) é um filme do cineasta Xavier Dolan, um belo rapaz canadense de apenas 24 anos. Se for pra falar de relacionamento esse é um filme completo. O longa vai passando por todos os estágios do que a gente costuma achar que é amor (porque vai saber o que ele verdadeiramente é), trazendo depoimentos que casam de forma inacreditável com a trama. 
Meus personagens favoritos: a menina neurótica de óculos e seu pseudo namoro real virtual; a coitada que nunca se cansa de esperar uma revolução em seu relacionamento para que, finalmente, ele possa ser apropriadamente chamado de relacionamento; o homossexual que procurar 'converter' o cara que ele jura que dá mole pra ele; e, claro, os que acreditam em papai noel e, consequentemente, em namoros a distância. 
Em síntese, o filme conta a história de dois amigos que se apaixonam pelo mesmo estonteante rapaz. Até aí, ok. Mas quando chega o final da história e você entende o que são aqueles risquinhos na parede; quando a rejeição é basicamente cuspida na sua cara e você se põe a lembrar de todas as vezes em que aquilo também já aconteceu com você; quando você começa a perceber o porque de algumas pessoas fumarem tanto (e chorarem tanto)... Bom, aí você percebe que esse não é um filme qualquer. 
O que torna "Les Amours Imaginaires" singular e magnífico são os cortes em que aparecem pessoas dando depoimentos que, apesar de terem o mesmo tema central, muitas vezes te deixam confuso quanto à coesão entre eles, mas, no decorrer do longa, percebe-se que todas as histórias são relacionadas por tratarem de "amores imaginários": amores que são, sobretudo, unilaterais; amores que crescem principalmente nesse terreno absurdo e incerto que é a nossa mente; amores que são formados especialmente de expectativas. Os amores imaginários são aqueles que duram apenas noventa minutos e que quando passam levem um pouco (e pouco aqui é eufemismo para quase completamente) da nossa vontade de acreditar, confiar, se entregar.



Depois de algum tempo refletindo a respeito do filme e relacionando tudo com situações da minha vida cheguei a uma terrível - sim, elas sempre são terríveis - conclusão: você vive procurando pela pessoa que vai te dar valor pelo que você é, mas quando ela finalmente aparece, você descobre que todo valor, todo amor que ela porventura possa te dar, é insuficiente. Todos somos pessoas-substitutas. O que você acha que acontece com a Cinderella depois do felizes para sempre? Acha que ela se contenta em ficar apoiando o príncipe em suas empreitadas? Será esse o "felizes para sempre"? Fazer sexo três vezes por semana, uma declaração de amor a cada sete meses? 
Depois do felizes para sempre, meu bem, é que o fardo começa a pesar. É depois dele que você descobre que o que você busca não tá em ninguém; e que a procura em si é só uma faceta disso que você não consegue descrever e que muitos chamam de in-sa-ci-e-da-de. Isso aí que você quer, infelizmente, não tá em lugar nenhum. E as chamadas não atendidas, os dias que você passa esperando um retorno, ainda que mínimo; os vagalumes que se recusam em aparecer e as músicas que nunca tocam na hora certa; as mentiras que a gente se força a acreditar até que elas se tornem meias-verdades: tudo isso faz a imbecilidade da nossa caça ficar aparente. E é por isso que você se identificou tanto com a menina que ia falando das esperas em restaurantes e nas pessoas que a gente coloca em pedestais.


Pelo bem ou pelo mal, todo mundo já teve um amor imaginário. Pode ter sido aquele professor de biologia no segundo colegial, ou aquele seu amigo da sétima série que gostava de te beijar pelos cantos. Pode ter sido aquele personagem do Remarque, ou o filho lindo da professora de piano; ou quem sabe (e esse talvez seja o mal dos nossos tempos), o garoto da internet que te disse mil coisas lindas nas muitas madrugadas em que você virou conversando com ele... Quantos outros exemplos cabem nesse parágrafo?
Comecei esse post contando uma das muitas experiências que tive com os amores imaginários. Não que tenha nenhum apreço por essa história em específico, é só que essa é a que menos me dói, a que com mais naturalidade consigo contar.
E me perdoem a generalização, mas chego aqui tendo uma certeza: todo amor é imaginário. E o é porque sempre vem acompanhado dessa falsa idéia de proteção e conclusão. E é porque a gente foi educado a pensar que só se é pleno quando se está sendo agraciado pela admiração alheia. 
Sobre o sentimento que vem depois que você descobre que tudo isso é uma fábula hedionda eu não sei escrever. Tenho passado meus dias tentando descobrir o que é que sobra quando você descobre que o amor não é a luz no fim do túnel, mas sim uma janela em um quarto escuro... E, bom, a noite sempre vem.

(
e na minha ingenuidade, ainda torço pra que um dia você venha, me pegue pela mão e diga "olha, você só tava no caminho errado, vem por aqui que vai dar tudo certo".)
- Esse texto é brega e de uma pieguice sem limites e já foi publicado aqui.

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